Fecha o cerco contra o Paquistão

2 12 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

Terroristas paquistaneses são os principais suspeitos dos ataques contra uma das principais cidades indianas. O governo do país vizinho e a comunidade internacional pressionam o Paquistão, acusado de proteger terroristas.

Apesar de outro grupo ter assumido a autoria dos atentados em Mumbai, a polícia indiana acusa militantes do Lashkar-e-Toiba (Exército dos Puros), ligados ao Paquistão e exige maior cooperação contra os terroristas. Por outro lado, o país islâmico nega qualquer relacionamento com as explosões em Mumbai.

velas em homenagem as vítimas dos ataques em Mumbai, na Índia. Rupak De Chowdhuri/Reuters

A mídia está sugerindo que os assassinatos estavam vinculados a uma organização que luta pela separação da região da Caxemira. As disputas entre o governo de Islamabad e o país vizinho são antigas, no entanto, não havia tamanha movimentação dos veículos de comunicação desde 1998 quando entraram para o restrito grupo dos detentores de armas nucleares. Para amanhã está prevista a visita de Condoleezza Rice em Nova Délhi. Será que vai ajudar ou atrapalhar?

Folha Online – Especial Mumbai

Estadão

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Quase 200 mortos em Mumbai

27 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

Ataques contra Mumbai deixam quase 200 mortos, atrapalham as negociações de paz com o Paquistão e assustam a mídia ocidental

Indianos lamentam as perdas e os estragos causados pelas explosões na antiga Bombaim

A princípio, O Globo, Folha, G1 e muitos outros veículos nacionais e internacionais contaram com poucas fontes (CNN, BBC, Reuters…) para informar sobre a tragédia indiana. No primeiro dia dos acontecimentos, a mídia brasileira apresentou um texto restrito e muito semelhante. As descrições, as fotografias e até os entrevistados eram os mesmos. Logo no começo (ainda no site), jornais como O Globo vincularam as ações com grupos terroristas islâmicos (o que mais tarde se confirmou, ainda que em parte).

Analisando as primeiras reportagens, o que mais chamou minha atenção foi a insistência em chamar Mumbai de Bombaim, a cidade mudou de nome há mais de dez anos! Não só é uma falha geográfica como também pode ser visto como algo tendencioso.

O nome Bombaim é uma corruptela da expressão portuguesa “Boa Baía”, a cidade antes de ser de domínio inglês foi colônia lusitana. O local foi batizado de “Mumbai” porque o antigo nome era considerado um resquício da colonização européia e alguns governantes decidiram que “Mumbai” estava mais de acordo com a cultura hindu. Coincidência ou não, os jornais do país ibérico ignoraram o novo nome.

A cobertura pelo periódico lusitano Jornal de Notícias

Público

O Globo

A versão eltrônica do jornal seguiu o erro e insistiu no termo antigo, até na manchete.

O mais estranho e confuso para o leitor foi a repentina utilização do nome oficial da cidade indiana no penúltimo parágrafo, sem nenhuma explicação está lá “ (…) Morador de Mumbai, disse à NDTV(…).” Um leitor mais desinformado (ou mesmo alguém que não estuda Geografia há mais de 10 anos) com certeza ficará confuso e talvez irá pensar que Mumbai se trata de um outro local.

Outro ponto discutível da reportagem é que a equipe de jornalismo optou por tratar o atentado como um ato de islâmicos fundamentalistas contra ocidentais. A palavra “terrorista” foi acionada logo no primeiro dia dos fatos, bem como foi dado espaço aos representantes do governo americano para falarem sobre os atentados. O grupo que assumiu a responsabilidade dos ataques, intitulado Deccan Mujahideen, foi vinculado a outros grupos radicais muçulmanos.

O poder das palavras usadas na cobertura jornalistíca para referir-se aos seguidores do islamismo acaba, mesmo que sutilmente, tendendo para um lado ou formando opiniões muitas vezes estereotipadas. Claro que o que ocorreu em Mumbai é um ato terrorista e que a prática de assassinatos (não importa a quantidade de vítimas) é altamente condenável e deve ser punida em um estado de direito. No entanto, é muito comum observar que as palavras como “terrorismo”, “ataques suicidas” e “fundamentalismo” são quase sempre destinada aos muçulmanos.  Será que só entre os muçulmanos há seguidores radicais? É altamente discutível a forma como os meios de comunicação tratam os povos árabes e as conseqüências disso para a sociedade.

O Hotel Taj Mahal, ponto turistico de luxo é atacado em Mumbai. Na era do terror a midia discute os perigos dos grupos supostamente ligados ao Paquistão.

O Hotel Taj Mahal, ponto turistíco de luxo é atacado em Mumbai. Na "era do terror" a mídia discute os perigos dos grupos supostamente ligados ao Paquistão.

Ainda, o pessoal do O Globo não só faltou nas aulas de Geografia como também nas de História. Uma interpretação justa dos fatos que estão acontecendo na Índia merecia citar que a rivalidade entre os povos na Índia existe há muito tempo, desde que Bangladesh e Paquistão integravam o território. Taxar todos os muçulmanos de terroristas fundamentalistas do “eixo do mal” é uma prática bastante difundida na mídia atualmente, é preciso ter cuidado.

Por causa dos alvos (hotéis, um restaurante e uma estação ferroviária) pode ter sido um ataque contra turistas, mas, ainda sim, é necessário cautela nos primeiros momentos.

Por último, uma questão ética, o texto informa que já foram mais de 200 ataques terroristas nesse ano naquele país. Mas, então, por que somente esse atentado foi amplamente divulgado? Volto a me questionar, será o conformismo? Ou o valor de uma vida gerada à esquerda do meridiano de Greenwich é maior para os meios de comunicação?

Outros periódicos

Até então, na maioria das vezes, os jornais foram mais contidos na cobertura, com informações repetitivas e quase sempre respeitaram o nome oficial da cidade que foi palco dos atentados.

O JB Online, ainda que de forma mais timída, também atribuiu a instabilidade politíca indiana aos muçulmanos (tomando emprestado um discurso quase preconceituoso da era Bush).


Estadão

A cobertura da Folha buscou fontes neutras e conseguiu uma matéria clara, contextualizada e desenvolvida de um modo mais adequado, abrangendo outros aspectos para explicar a atual situação indiana.

Novas informações da AFP

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A caminho do esquecimento

23 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

O Jornal Nacional começou a reportagem sobre o filme que aparece o segundo homem da organização terrorista Al Qaeda, o egípcio Aiman Al-Zawari, comentando sobre o presidente eleito Barack Obama da seguinte forma:

“A rede terrorista Al-Qaeda, de Osama Bin Laden, fez um ataque pesado a Barack Obama. Por enquanto, com palavras.” Veja o vídeo no site:

reportagem do JN

O texto foi conclusivo e quase ameaçador, o telejornal poderia ter transmitido partes do vídeo para o telespectador. O público que assistiu o programa não ficou sabendo, por exemplo, que Al-Zawari considerou a eleição de Obama um reconhecimento do povo americano da derrota no Iraque, ou que ele afirmou que o Bush está deixando para seu sucessor uma situação difícil, ou ainda que Zawari crê que os americanos se mostraram temerosos de eleger alguém como Bush, por isso, optaram por quem queria trazer de volta as tropas do Iraque. Além disso, no vídeo, ele citou e colocou imagens de Malcom X discursando.

O egípcio, ainda, condenou duramente a possibilidade de enviar as tropas do Iraque para o Afeganistão. Ele afirmou que todos os que apoiaram a invasão do Afeganistão não conhecem a história desse povo e de outros que seguem o islamismo. E,  também se posicionou contra as declarações que Obama fez sobre as relações que irá manter com o Irã.

É marcante como a rede Globo suprimiu a notícia que o membro da Al-Qaeda lembrou. Ele revelou que há alguns dias, 40 pessoas morreram em uma festa de casamento em Kandahar (Afeganistão). Zawari denunciou o assassinato de civis no Afeganistão e acusou as tropas americanas que invadiram e ainda ocupam o país.

Ao assistir a gravação fica evidente (especialmente no final) que Aiman estimulou assasinatos e ataques suicidas. Ele disse claramente que a cruzada islã não tinha acabado e que os mujahedeens deviam se empenhar na Jihad, o líder fundamentalista chegou a afirmar “não coloquem suas armas no chão” e convocou grupos terroristas da Etiópia e da Somália (o que também não foi abordado no Jornal Nacional).

Mas, resumir o filme como a equipe de jornalismo da emissora fez é descontextualizar e mostrar só um lado da guerra. Afinal, todo combate armado é feito por terroristas. Por que as mortes em Kandahar são menos desprezíveis para a mídia? Ou melhor, Por que são esquecidas?

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Yes, we can!

18 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Existe motivo para comemorar?
Analisando reportagens a fim de provocar uma reflexão (na própria autora do blog, inclusive) sobre o respeito (ou não) dos direitos humanos nos países africanos e asiáticos. Ou, ainda, sobre o modo como a imprensa ocidental trata as questões relacionadas.

Em entrevista, ontem, Barack Obama anunciou que dará fim à prisão americana de Guantánamo, em Cuba. O recém-eleito, também, frisou a promessa de campanha de que irá retirar as tropas americanas do Iraque.

“Disse reiteradamente que os EUA não torturam e vou me assegurar de que não torturamos.”

A Anistia Internacional divulgou uma nota se mostrando satisfeita com a posição de Obama e reivindicando uma investigação dos delitos contra os direitos humanos cometidos durante a “guerra contra o terror.”

A medida é um avanço na luta pelo estabelecimento dos direitos humanos, já que, a base militar abriga diversos presos sem acusações formais e é apontada como palco de torturas, inclusive contra adolescentes. Mas, é válido ressaltar que a investigação dos casos de abusos, torturas e desrespeitos à Convenção de Genebra em todas as penitenciárias sob o comando americano deve ser feita e os agressores punidos. Depois de várias imagens e notícias de Guantánamo e, principalmente, as fotografias de Abu Ghraib, não há dúvidas das infrações de oficiais americanos.

Protestos da AI contra o departamento carcerário instalado no caribe

Protestos da AI contra o departamento carcerário instalado no caribe

A repercussão na mídia

O Estadão não fez análises sobre o significado do fechamento da base naval. Não creio que houve falhas do jornal, acredito que a redação optou por seguir uma linha mais “neutra”, ainda sim, o jornal paulistano encerrou a matéria vinculando Guantánamo com a luta contra o terror (mesmo que timidamente). Enquanto que o Diário de Notícias (jornal português) revelou um aspecto bastante negativo da era Bush:

“A prisão em Cuba é um dos símbolos dos excessos da administração Bush na luta contra o terrorismo, famosa por manter suspeitos sem acusação e sob tortura. Desde que foi aberta. em 2002, mais de 800 homens e adolescentes passaram por aquele centro de detenção e 255 desses ainda ai permanecem. ” O jornal lusitano conseguiu aliar um tom critíco (mas, verdadeiro) com um repasse de
informações explicadas e contextualizadas.

A Folha de S. Paulo se posicionou ao optar por ceder um grande espaço da matéria para uma ONG que defende os direitos humanos e sem nenhuma outra fonte que represente a opinião contrária:

“A organização americana de defesa dos direitos humanos HRW (Human Rights Watch) pediu hoje a Obama que rejeite as ‘escandalosas práticas antiterroristas’ do governo do atual presidente George W. Bush.

‘Ao assumir as funções, o presidente Barack Obama deve repudiar categoricamente as práticas antiterroristas escandalosas dos sete últimos anos e adotar uma política eficaz e eqüitativa’, afirmou a organização em comunicado.

A HRW sugeriu ao novo presidente fechar o centro de detenção militar de Guantánamo e ‘rejeitar a guerra contra o terrorismo como base jurídica para prender pessoas suspeitas de terrorismo’.

Pede também que Obama acabe com as prisões secretas da CIA e ainda repudie ‘as normas do Departamento de Justiça e do presidente que autorizam a tortura e outros maus-tratos’.

‘Há muito tempo, os Estados Unidos reduziram sua capacidade de luta contra o terrorismo ao adotar uma política de vista curta que autoriza a tortura e a detenção ilimitada sem indiciamento’, afirmou o diretor de HRW, Kenneth Roth.”

Saiba mais:

O Estadão
Diário de Notícias
Folha de S. Paulo

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Os últimos pigmeus

17 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

Reportagem do El País denuncia condição de escravidão do povo pigmeu em Camarões

Matthieu Sangou, usando adereços tipicos dos bakas para cerimonial de caça. A foto ilustra a matéria e é de Isabel Muñoz.

Matthieu Sangou, usando adereços típicos dos bakas para cerimonial de caça. A foto ilustra a matéria e é de Isabel Muñoz.

Ontem, no endereço eltrônico do El País , uma reportagem sobre os pigmeus me chamou a atenção por dois motivos. Primeiro porque é comum ouvir falar no nome da etnia que de acordo com o Houaiss pode possuir até um caráter pejorativo, mas, pouco se sabe da história deles. Do ponto de vista dos direitos humanos, a matéria da jornalista Lola Huete Machado mostra que muitos pigmeus (ou bakas, como preferem ser chamados) vivem em condições de extrema miséria e até de escravidão. Muitos bakas são propriedades de Bantús (grupo étnico majoritário em Camarões).

Trecho do texto publicado no jornal espanhol: “Los pigmeos no tienen derechos sobre la tierra ni documentos de identidad; muy pocos están escolarizados; sus condiciones de salud, higiene y alimentación son precarias, y dependen para subsistir de otras tribus…, había resumido antes, en Bertoua, Denis Tchounkeu, coordinador del programa Derechos y dignidad de los baka(…)”

leia a matéria do El País

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BBC não reconhece o genocídio armênio

14 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

veículo se posiciona em matéria sobre a morte de Hrant Dink

A fotografia que ilustra o texto da BBC traz a imagem do funeral de Dink e evidencia as homenagens ao jornalista.

A fotografia que ilustra o texto da BBC traz a imagem do funeral de Dink e evidencia as homenagens ao jornalista.

É possível fazer uma breve análise da redação da reportagem “milhares participam de funeral de escritor morto em Istambul” tentando observar a “neutralidade” jornalística.

“Dink, editor do diário turco Agos, levou três tiros em frente à sede do jornal em Istambul. O jornalista foi uma das pessoas processadas na Turquia sob as severas leis que proíbem ‘insultos à identidade turca’. Dink chegou a ser condenado a seis meses de prisão por ter escrito sobre o ‘genocídio’ armênio de 1915, mas teve a pena suspensa. Participantes da procissão levaram placas com as palavras ‘Somos todos armênios’, ‘Somos todos Hrant Dink’, parando e aplaudindo quando a procissão passou pelo lugar onde Dink foi morto a tiros. A correspondente da BBC em Istambul Sarah Rainsford afirmou que os participantes do funeral querem expressar a solidariedade e o horror causado pelo assassinato. E muitos já estariam considerando Dink como um mártir.”

A foto de armênios durante a repressão violenta do Império Turco Otomano

A foto de armênios durante a repressão violenta do Império Turco Otomano

É interessante observar que o autor do texto da BBC dá destaque aos que estiveram na procissão e se solidarizaram com a morte de Hrant Dink. É possível inferir que os jornalistas responsáveis pelo texto de algum modo simpatizam com a idéia da não-violência ou de assassinatos por motivos étnicos, respeitando idéias consolidadas de direitos humanos.

Mas, existe bastante cuidado para não ser um texto partidário, o que fica evidente na não divulgação da nacionalidade (ou ascendência) dos que protestaram contra o assassinato de Dink. Seria uma parcela da população turca que afirmava que era Armênia? Ou eram membros da comunidade Armênia na Turquia? Será possível turcos considerarem o jornalista morto um mártir? Por causa do medo da parcialidade ou de desagradar alguns leitores (o número de imigrantes de ambos países é grande na Europa) a informação não é tão clara.

A partir do trecho, é possível também refletir sobre a escolha da palavra “procissão” no lugar de “protesto”, não que o emprego do vocábulo esteja incorreto, de forma alguma, mas “procissão” parece atribuir um caráter mais passivo para o aglomerado de pessoas que estavam no local. Se, de fato, foi uma comoção solidária ou um protesto de armênios não se sabe. A imprensa trata do assunto tão delicado do modo mais neutro possível, evitando uma polêmica entre alguns grupos étnicos. Essa neutralidade que a imprensa ocidental tenta empregar também pode gerar bastante reflexão, será a BBC a grande defensora dos Direitos Humanos?

Há diversos registros de enforcamentos públicos de lideres armênios da época

Há diversos registros de enforcamentos públicos de líderes armênios da época

Mais adiante, o texto segue em tom neutro, quase descritivo:
“Centenas de milhares de armênios morreram em 1915, em um episódio em que alguns historiadores identificaram o assassinato sistemático da minoria armênia por turcos e classificam como genocídio. A Turquia, no entanto, afirma que não houve matança sistemática e que os armênios foram vítimas da Primeira Guerra Mundial. Até hoje, a Turquia e a Armênia não mantêm relações diplomáticas.”
O que poderia ser um aspecto positivo do posicionamento da BBC e até da influência que o grupo de comunicação tem na sociedade se perde na questão do genocídio armênio, ou seria “genocídio”?

Ao lado da matéria, o link “Tire suas dúvidas. Entenda a polêmica sobre o suposto ‘genocídio’ armênio” revela o posicionamento do veículo quando não afirma o genocídio contra o povo armênio. E, ainda, se coloca numa posição de especialista que poderá esclarecer as questões do leitor sobre o tema.
Ao clicar no link, aparece uma página com diversas perguntas e respostas, segue alguns trechos:
“Por que a Armênia acusa os turcos otomanos de ‘genocídio’?

O número de mortos é bastante discutido, para alguns deve haver determinada quantidade de assassinatos para ser considerado um genocidio. O Tribunal Penal Internacional não restringiu o uso da palavra genocidio para assassinatos com uma quantidade minima de vitimas

O número de mortos no massacre é bastante discutido, para alguns deve haver determinada quantidade de assassinatos para ser considerado um genocídio. No entanto, o Tribunal Penal Internacional não restringiu o uso da palavra genocídio para crimes com uma quantidade mínima de vítimas

Durante a Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano – que enfrentava a Tríplice Entente, formada por Grã-Bretanha, Rússia e França – convocou todos os seus homens para lutar. O recrutamento não foi bem recebido por muitas das minorias étnicas e religiosas do Império. Os armênios eram um dos grupos que se rebelaram contra a guerra e a opressão de Istambul.

A resposta teria vindo em abril de 1915, quando o governo turco otomano reuniu cerca de 250 líderes da comunidade armênia no Império. Alguns deles teriam sido deportados, outros, executados. Nos dois anos seguintes, aproximadamente 1,5 milhão de armênios teriam sido mortos pelos turcos. (…)

O que diz a Turquia a respeito do episódio?

Para a Turquia, as mortes foram o resultado de uma guerra civil, agravada pela fome e doença, durante o colapso do Império, que teria deixado vítimas de todos os lados. Além disso, o governo turco contesta os números armênios, alegando que eles são exagerados.

Quais são os interesses da França na controvérsia sobre o ‘genocídio’ armênio?
A comunidade armênia na França tem entre 300 e 400 mil pessoas e os críticos dizem que a aprovação da lei que torna crime negar o genocídio é uma manobra eleitoreira da oposição ao governo do presidente Chirac, com vistas à eleição presidencial do ano que vem. Os descendentes de armênios no país defendem a medida e consideram que a lei finalmente faria justiça à memória das vítimas do massacre.”

Protestos da comunidade armênia na França, durante o debate sobre tornar crime a negação do genocidio de 1915

Protestos da comunidade armênia na França, durante o debate sobre tornar crime a negação do genocídio de 1915

Voltando à questão da posição de defensores dos direitos humanos da imprensa. A Declaração Universal dos Direitos Humanos não define crimes de genocídio, mas, isso é feito no Tratado de Roma, que deu origem ao TPI (Tribunal Penal internacional):

“Artigo 6.º
Crime de genocídio
Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por genocídio qualquer um dos atos que a seguir se enumeram, praticado com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, rácico ou religioso, enquanto tal:
a) Homicídio de membros do grupo;
b) Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo;
c) Sujeição intencional do grupo a condições de vida pensadas para provocar a sua destruição física, total ou parcial;
d) Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo;
e) Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo.”

“Afinal, Quem ainda se lembra dos Armênios?” Adolf Hitler, 1939.


A banda de origem armênia System of a Down, na imagem com a diretora do documentário Screamers Never Again, Carla Garapetian. Os músicos são atuantes no reconhecimento do crime contra seus antepassados, as mensagens são dadas ao público através das letras de suas canções e também no diálogo com politicos.

A banda de origem armênia System of a Down, na imagem com a diretora do documentário "Screamers Never Again", Carla Garapetian. Os músicos são atuantes no reconhecimento do crime contra seus antepassados, as mensagens são dadas ao público através das letras de suas canções e também no diálogo com politícos.

Além disso, é de extrema relevância para os armênios o reconhecimento de uma série de assassinatos contra esse povo no passado. Tomar partido nesse sentido não é apoiar uma nação ou outra, tampouco condenar o povo turco nos dias atuais, já que, ainda, conforme o Tribunal Penal Internacional, não há efeito retroativo, ou seja, os crimes cometidos antes do tribunal entrar em vigor não podem ser punidos pela instituição. Mas, reconhecer um crime contra um povo é estar de acordo com os direitos humanos, é lembrar com dignidade das vítimas. Mais do que isso, é lembrar para a sociedade o que foi aquele crime contra a humanidade e evitar que outros absurdos baseados na opressão de minorias dentro de um país ocorra.

Conforme afirmou uma cientista política no documentário “Screamers Never Again”, o fato de não terem conseguido aniquilar toda a população armênia não significa que não era essa a intenção.

A matéria da BBC

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Impressões pessoais de uma guerra sem fim

12 11 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

Guerra no Congo, mais um conflito em solo africano pouco discutido, por quê?

“ONU acusa militares do Congo de saques e violência sexual
Nações Unidas pedem mais 3 mil soldados para força de paz; existem dez soldados para cada 10 mil habitantes

Agências internacionais

GOMA, Congo – Centenas de soldados do Exército do Congo destruíram vários vilarejos, estupraram mulheres e saquearam casas enquanto fugiram da ofensiva rebelde no país, afirmou a ONU nesta quarta-feira, 12. Segundo a BBC, o subsecretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para Operações de Paz, o francês Alain Le Roy, pediu formalmente um contingente extra de 3 mil soldados para o conflito no país africano.”

extraído do jornal O Estado de São Paulo

   	 Rehema é uma das 17 mil pessoas que moram em um campo de refugiados na República Democrática do Congo. Ele fez parte do projeto do fotógrafo de moda britânico John Rankin, que quer mostrar, pela fotografia, o espirito dos refugiados apesar das condições adversas em que vivem.

Rehema é uma das 17 mil pessoas que moram em um campo de refugiados na República Democrática do Congo. Ele fez parte do projeto do fotógrafo de moda britânico John Rankin, que quer mostrar, pela fotografia, o espírito dos refugiados apesar das condições adversas em que vivem.

Há cerca de um ano escrevi sobre a (falta de) abordagem dos conflitos africanos na grande mídia ocidental, e, conseqüentemente, nos veículos brasileiros. Na época afirmei:

“A divulgação de notícias e imagens dos conflitos africanos é feita de modo bastante particular, talvez porque os próprios conflitos no continente sejam vistos de um modo único, o fato é que as guerras africanas são pouco comentadas e raramente são motivos de espanto e mobilização efetiva da opinião pública.”

E tentei fazer uma reflexão, afinal, por que não damos atenção aos conflitos africanos? Tentei pensar alguns elementos que poderiam esclarecer as razões de tamanho descaso:

O fotógrafo britânico relembra que, apesar de marcados pela pobreza, os refugiados se divertiram com a sessão de fotos. Eu tirei uma foto e, quando olhei para trás, vi Jasmine segurando uma latinha brincando de fotógrafo.

O fotógrafo britânico relembra que, apesar de marcados pela pobreza, os refugiados se divertiram com a sessão de fotos. "Eu tirei uma foto e, quando olhei para trás, vi Jasmine segurando uma latinha brincando de fotógrafo."

“Um dos motivos pode ser explicado através de uma declaração feita no documentário screamers, da diretora Carla Garapedian. Uma autoridade dos EUA afirmou que muitos cidadãos americanos viam na televisão cenas do confronto entre Hutus e Tutsis, em Ruanda, durante a guerra civil, e se sensibilizavam, mas não tomavam nenhuma atitude, pois, os americanos não se identificavam com aquelas imagens. Para ele, nos conflitos da península balcânica existe uma maior assimilação do povo americano, afinal, são mulheres saindo de casa para trabalhar, passear, levar os filhos na escola, usando sapatos de salto altos e de repente explodem bombas perto delas, como nas filmagens da guerra da Bósnia em 1992. segundo essa teoria, os americanos se viam naquelas situações cotidianas muito mais do que nas paisagens africanas.”

Outro possível motivo que levantei foi: “As agências de notícias destacam conflitos em locais com atrativos econômicos (golfo Pérsico e Mesopotâmia), interesses políticos, ou que de alguma maneira se relacionam as grandes potências (EUA, Europa Ocidental, Japão..) e acabam dando pouco destaque a genocídios como o de Darfur, no Sudão. Por exemplo, agências de notícias como a Reuters, a France Press e a BBC, que são fontes de informações e imagens para quase todos as nações, priorizam notícias que interessam seu país sede ou suas relações.”

 	 Fidel tem um temperamento incrivel, disse Rankin. Ele tinha tanta energia. Foi o primeiro a perceber o que eu estava fazendo. A exposição Rir um pouco, organizada pela Oxfam, ficará em cartaz de 21 de outubro a 21 de dezembro no lado de fora do Teatro Nacional de Londres.

"Fidel tem um temperamento incrível", disse Rankin. "Ele tinha tanta energia. Foi o primeiro a perceber o que eu estava fazendo." A exposição Rir um pouco, organizada pela Oxfam, ficará em cartaz de 21 de outubro a 21 de dezembro no lado de fora do Teatro Nacional de Londres.

E, hoje, me pergunto, de novo, por que nós damos tão pouca atenção para a guerra no Congo? por que quase não existem correspondentes internacionais na África? Por que não há comoção nacional?
Talvez porque ao contrário das guerras travadas pelos americanos, não há soldados dos EUA ou dólares de contribuintes daquele país gastos em armas… Ou porque não existe um vilão, um invasor… Em que Consulado os jovens fariam um protesto? Como aquele que os brasileiros fizeram na embaixada americana no início da guerra contra o Iraque?

Tumanini tem oito filhos e sustenta a familia fazendo consertos de roupas. Minha máquina de costuras alimenta meus filhos. Eu a trouxe comigo quando fugi no meio da noite. Estava muito pesada, mas eu consegui carregar. É a minha vida.

Tumanini tem oito filhos e sustenta a família fazendo consertos de roupas. "Minha máquina de costuras alimenta meus filhos. Eu a trouxe comigo quando fugi no meio da noite. Estava muito pesada, mas eu consegui carregar. É a minha vida."

Ou será um eterno conformismo? A passividade em relação aos constantes embates armados na África?

São apenas algumas reflexões, algumas radicais, outras nem tanto. Esse exercício foi bastante interessante para mim (como uma futura jornalista), achei construtivo observar e tentar repensar a situação de marginalização de um continente por meio da mídia. A imprensa reflete um comportamento da sociedade e, ao mesmo tempo, garante a manutenção desse comportamento.

Finalmente, decidi, num post com um enfoque tão particular, inserir fotografias de John Rankin, o fotógrafo sempre esteve relacionado ao mundo da moda, talvez por isso, conseguiu uma perspectiva diferenciada dos refugiados da guerra do Congo. É possível pensar na obra de Rankin como inovadora, não apenas porque ele retratou cenas tão ignoradas pelos meios de comunicação. As imagens transmitem esperança, tratam aqueles refugiados com bastante dignidade e estabelece uma relação de simpatia e afeição, a compaixão é aguçada de modo muito menos intenso que o comum nesse tipo de fotografia, mas isso são apenas impressões pessoais…

Saiba Mais:

Cobertura da guerra do Congo pelo Estado de São Paulo

Todas as fotografias e as legendas foram retiradas do site da BBC


A Não Cobertura do Jornal Nacional

O principal telejornal do Brasil não divulgou informações sobre o conflito africano. Parece que a equipe de Jornalismo do programa deu prioridade para outras pautas, como essa:


Conheça o Cruzeiro de Rondônia, o pior time do Brasil

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400 vítimas em atentados na Índia, mas, Barack Obama anda confiante demais

31 10 2008

por Marcela Cataldi Cipolla

Explosões matam cerca de 60 pessoas e deixam pelo menos 300 feridos em Assam, na Índia.

Área atingida por bombas no nordeste da Índia

Área atingida por bombas no nordeste da Índia

O território de Assam faz fronteira com Bangladesh, Butão, China e Mianmar e fica isolado do resto do país por razões naturais. Os não-hindus representam 40% da população e muitos apontam descaso do governo indiano. Grupos separatistas como a Frente Unida de Libertação de Assam (Ulfa) atuam na região desde a independência indiana e dividem a suspeita da autoria do crime com milícias islâmicas (30% da população é muçulmana), especialmente aquelas compostas de imigrantes de Bangladesh.

As informações dadas pela Folha, Estado, Uol Notícias e todos os outros veículos brasileiros apesar de não fornecer dados precisos (os números de mortos e feridos não estão compatíveis) são muito semelhantes, isso porque a fonte é praticamente a mesma, Reuters, AFP, BBC e outras agências internacionais de notícias. As imagens também são escassas, já que, a região apesar de turística, está longe da capital indiana e a nação asiática apresenta pouca unidade. Além disso, atentados separatistas são comuns em um país onde se falam cerca de 20 línguas e 1.600 dialetos.

Mapa da Índia

Mapa da Índia

Como abordar a Índia em um veículo nacional, com tanta instabilidade política entre os seguidores do Bramanismo? Será que o brasileiro só se interessa pela nação quando o tema é rodada de Doha, G20, BRIC ou “viagens exóticas” como a mídia coloca, atualmente? Será que, comercialmente, vale a pena para a imprensa notícias da Índia sendo que a comunidade daquele país no Brasil é de cerca de 380 famílias? E eticamente?

Finalmente, Por que uma insistente cobertura das eleições norte-americanas assola as primeiras capas da seção de política internacional com tantas outras coisas acontecendo no mundo?

Para saber mais:

Abril

Veja

Folha

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